Célio Heitor Guimarães é um apaixonado pelas coisas que faz. Tive a felicidade de conviver com ele no início dos anos 1990, quando participávamos de um grupo de estudos que pretendia instituir no Poder Judiciário um novo modelo de plano de carreira para o funcionalismo. As mudanças que nos pareciam indispensáveis naquela época distante não aconteceram. Foram vencidas pelo assim chamado “sistema”, que nunca teve interesse em se corrigir. Ainda hoje, distorções graves na estrutura do serviço público seguem intocadas, cada vez maiores e mais complexas, a nos perturbar a paciência.

O bom dessa experiência é que ficamos amigos, o Célio e eu. Aprendi a respeitar o meu colega, já então aposentado, pela sua firmeza de caráter e pelos cuidados virginianos que dão estilo aos seus escritos. Uma referência de ser humano para mim, que era um jovem barnabé inconformado com a lógica esquisita do poder.

Longe do Tribunal, conversávamos com certa frequência sobre uma coluna que ele mantinha semanalmente no extinto jornal O Estado do Paraná. Tornado famoso, o espaço durou de 1997, aproximadamente, até o melancólico fechamento do velho diário, alguns anos atrás, esmagado pela virtualidade moderna e suas mensagens instantâneas.

Quem não se deu por vencido foi o Célio, imediatamente recepcionado por outro jornalista de raiz, o Zé Beto, que o incorporou à equipe de cronistas do seu blog (www.zebeto.com.br). E o Célio está lá, todas as quintas-feiras, a comentar o que pouca gente comenta por estas bandas. Gosto de ler os desabafos do meu comandante. São textos coerentes, límpidos, a refletir, como ele mesmo diz, um misto de esperança e desencanto. Nossas opiniões nem sempre coincidem, mas o essencial é que compreendemos e toleramos as divergências que existem entre nós – algo simples e óbvio, mas que se tornou raridade no tempo sombrio de agora.

Eis que, finalmente, o Célio aceitou um desafio antigo que lhe fizemos nós, os leitores que o acompanham: reunir os seus artigos num livro. Antes, em 2008, ele ensaiou uma pequena produção artesanal, intitulada Como diz Rubem Alves: lições que aprendi com o grande mestre. Nela, está uma parte das suas crônicas semanais em O Estado do Paraná, organizadas a partir de um fio condutor: a admiração enorme do jornalista pelo filósofo Rubem Alves, que ainda era vivo. “Rubem”, dizia o meu amigo, “é uma figura mágica, cuja escrita encanta e faz bem. A leitura de suas crônicas enche-nos de felicidade e sabedoria. Faz-nos ver o mundo de modo diferente e dá-nos alegria de viver”. E completava, numa síntese poética e bela: “Como ele, odeio os hipócritas, os cínicos, os canalhas de plantão, o Deus vingativo das religiões, os adultos que esqueceram a arte de brincar, os exploradores da ignorância popular, os assassinos da natureza, as ditaduras, as escolas que trituram os alunos, o fanatismo religioso, os homens de negócio, a ganância capitalista, a inveja…”.

Guardo com carinho aquele exemplar que me foi oferecido há dez anos. E aguardo, ansioso, o que está por vir: o Com todo respeito, Excelências!, obra cujo teor conheço de antemão, das colunas que meus olhos procuram todas as semanas na caixa de email, gentilmente enviadas pelo seu autor, mas que ainda não vislumbro em seu conjunto e em sua produção gráfica. Será, como avisa o subtítulo do livro, o “registro de tempos obscuros nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de 1998 a 2018”. Chumbo grosso, portanto, de leitura indispensável.

 

Ao meu grande comandante, dedico estas breves considerações, que são de agradecimento e admiração. Ave, Célio!